Ela reclamou da poltrona do avião e gritaram: emagreça! Ela pediu cadeiras maiores no cinema e gritaram: o mundo não tem que se moldar a você, você que emagreça! Ela dançava e gritavam: que horror, emagreça! Ela desfilou e representou moda plus size e a acusaram de ganhar dinheiro normalizando uma doença crônica e gritaram: emagreeeeeça! Ela fez bariátrica e emagreceu, agora gritam: hipócrita, traidora, incoerente...
Nem todo mundo tem condições de operar particular e pelo SUS a fila é de vários anos. O que um obeso mórbido deve fazer pra agradar vocês? Continuar escondido, desistindo de si, com vergonha de ser visto, inseguro de frequentar lugares, sendo olhado com nojo, com pena ou com pavor? Ou de fato era necessário que alguém se manifestasse e desse a cara a tapa para que o obeso fosse enxergado como parte do todo?
Quem não quer ser normal, gente? Quem não quer ficar saudável, ter disposição, não sentir tantas dores, conseguir fazer coisas básicas sem dificuldades? Vestir uma boa roupa que não tenha só os buracos pra enfiar a cabeça e os braços, que seja confortável e bonita? Quem tem prazer em ter que fazer roupas porque não encontra sua numeração? Quem tem prazer em ser ponto de referência e ser anulado de todas as formas? Vão à merda!
Não conheço um obeso sequer que não lute diariamente contra a obesidade e mesmo que perca peso, o reganho é triplicado porque é doença! Eu mesma já fiz dezenas de tentativas e estou tentando mais uma, para não morrer antes da minha cirurgia sair. Meus dois irmãos já fizeram bariátrica e uma sobrinha também. Dois estão obesos de novo, porque bariátrica é apenas o início de um tratamento que vai durar o resto da vida, qualquer indisciplina atrapalha o processo inteiro.
Até conseguir, preciso vestir, sair, frequentar lugares, enfrentar filas, subir escadas, sentar em cadeiras apertadas, trabalhar, etc. E que bom que alguém lutou por mim e ajudou a mudar muitas coisas, porque muitos obesos como eu, não tem voz, só a insistência de continuar vivos.
Nem todo mundo é bocudo como eu que já calei muita gente sem noção. Essa moça foi até educada demais apenas processando enquanto atingia seu foco.
Povo gosta de citar seus lugares de fala, mas quando a dor é do outro, nem um doente crônico é aliviado. O preconceito vem sem lubrificante nem nada.
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